sexta-feira, janeiro 05, 2007

O ANJO

Um anjo como este o melhor que tem a fazer é ficar à espera de que alguém lhe diga que precisa dele. Muitas vezes, leva mais tempo do que ele pensa; ele tem mesmo de ser mais comedido, não deve julgar-se insubstituível. Pela minha parte, não gostaria de estar no lugar daquele de quem fiz um anjo. Fiz dele um deus, para que ele nunca mais viesse ao meu encontro em parte alguma, para que fosse imóvel como uma imagem e eu pudesse dirigir o meu olhar para ele conforme precisasse ou desejasse. Quase me faz pena que ele tenha julgado que eu sou curioso e que vou andar a correr atrás dele, agora que eu quase o trago metido no bolso ou que o tenho agarrado a mim como se ele fosse uma fita amarrada em redor da minha testa. Já não sou eu quem vai ter com ele, é o valor dele que me envolve, é o fulgor da sua luz que me rodeia. Quem soube dar soube também tomar para si. Tanto uma coisa como outra têm de ser praticadas. Ele nasceu da compaixão, mas pode acontecer que eu, o implorante, brinque com ele. Ele duvida, inquieta-se. Eu umas vezes creio, outras descreio, e ele tem de levar isso com paciência, esse querido.
A Rosa
Robert Walser

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